O Conselho da Europa já pediu a criação de um organismo internacional dedicado à proteção da privacidade, à medida que as economias se digitalizam e globalizam
Segundo o comité de proteção de dados do Conselho da Europa, os serviços de inteligência espalhados pelo mundo devem ser protegidos por um organismo internacional com o poder de garantir que os governos não utilizam os dados pessoais para fins de vigilância. Os países devem concordar, a nível internacional, sobre a extensão em que a vigilância realizada pelos serviços de inteligência pode ser autorizada e sob que condições. A organização Europeia de direitos humanos acredita que os apelos por uma melhor proteção de dados a nível internacional são especialmente relevantes em tempos de crise, quando as circunstâncias fornecem aos governos uma oportunidade de restringir legalmente os direitos de privacidade dos cidadãos. Embora às vezes motivadas por preocupações legítimas, como ameaças à segurança nacional, essas restrições precisem de uma supervisão rigorosa, para que tenham uma série de salvaguardas. A COVID-19 fez com que os serviços de saúde digital e rastreamento de contatos intervenham cada vez mais na vida de muitas pessoas como resultado da pandemia, às vezes com consequências prejudiciais na proteção de dados pessoais. E as cidades, por exemplo, aproveitam cada vez mais as tecnologias de vigilância que vão desde ferramentas de monitorizamento de tráfego até câmeras de CFTV para controlar o levantamento de restrições de bloqueio. Em França, o governo testou um software de reconhecimento facial numa estação de metro em Paris,para sinalizar passageiros que não usavam máscara. Embora a iniciativa tenha sido prontamente cancelada pela agência francesa de proteção de dados, reflete o facto dos governos explorarem tecnologias que se intrometem na privacidade dos cidadãos em tempos extraordinários. O Conselho da Europa pediu repetidamente a criação de um organismo internacional dedicado à proteção da privacidade nos últimos anos, à medida que as economias se digitalizam e globalizam simultaneamente, resultando em grandes quantidades de dados pessoais a fluírem através das fronteiras. O exemplo mais próximo de um acordo internacional sobre proteção de dados que existe atualmente é a Convenção 108 – um tratado criado em 1981 pelo Conselho da Europa, retificado até agora por 55 países e que é um instrumento legalmente vinculativo sobre proteção de dados. Mas enquanto o Conselho da Europa espera que o tratado se torne um padrão internacionalmente reconhecido sobre privacidade, os presidentes da comissão reconheceram que a Convenção 108+ não é suficiente para garantir a proteção em todos os lugares onde os dados fluem. Por exemplo, em julho passado, o Tribunal europeu de Justiça (ECJ) decidiu que o Escudo de Privacidade UE-EUA, que foi acordado para facilitar os fluxos de dados transatlânticos, não era suficiente para garantir a proteção dos dados europeus nos EUA, e numa decisão chamada "Schrems II", o TJCE invalidou o acordo,causando interrupções significativas no comércio entre os dois continentes. Na perspetiva de Alessandra Pierucci, presidente do comitê de proteção de dados do Conselho da Europa, sem normas internacionais sobre proteção de dados, decisões como a de Schrems II só se multiplicarão, com consequências potencialmente graves nas relações internacionais. |