As alterações do software empresarial

O software é essencial para as organizações. Hoje, já não é o ‘simples’ ERP, mas sim uma panóplia de soluções que são indispensáveis para o bom funcionamento da organização. A Bravantic, a Latourrette Consulting, a Noesis e o SAS partilham a sua visão sobre o mercado de software empresarial

As alterações do software empresarial

Mais do que nunca, os dados são um recurso indispensável para as empresas e utilizar os mesmos é essencial, não só para a competitividade das empresas, como também para a sua sobrevivência. De acordo com a Gartner, o software empresarial será o único subsetor do IT a registar crescimento expressivo em 2023 (11,8%) impulsionado com necessidade das organizações otimizarem custo de operação através da automação de processos, continuarem a disrupção digital e ganharem vantagem competitiva.

Como tal, as tecnologias de software empresarial – desde os ERP e CRM até às áreas de Business Intelligence, Analytics e Supply Chain Management, passando pelo agora indispensável software colaborativo – tornam-se num verdadeiro sistema nervoso para as operações das empresas, particularmente com a rápida digitalização da economia e os novos modelos de negócio e trabalho.

Segundo a IDC, o foco do consumo de software empresarial já não está na simples seleção e uso de soluções, mas sim na construção de capacidades de software adaptadas às necessidades e objetivos da empresa. Em suma, já não basta implementar novas ferramentas, é necessário repensar todo o ecossistema para responder às necessidades do negócio.

O software empresarial tem sofrido alterações nos últimos anos. Ainda faz sentido falar em software de gestão ou, atualmente, o software utilizado já vai para lá da 'simples' gestão da empresa?

Carlos Latourrette, CEO, Latourrette Consulting: “Atualmente, estamos perante outro tipo de necessidades que são cobertas por outras soluções e plataformas que entram em camadas para além do core [do negócio]. Podemos ver o core do software de gestão mais direcionado às atividades core da empresa e, depois, temos outras camadas, nomeadamente o software de gestão de processos ou de gestão de recursos documentais”

Filipe Marcelino, Senior Manager Digital Solutions, Bravantic: “O termo gestão é muito abrangente e o software tem desempenhado um papel importante na gestão da empresa, seja em termos financeiros ou produtivos. Há outro indicador que é cada vez mais importante: mediante o negócio da empresa, ser possível identificar as tendências do seu próprio negócio, perceber o que os seus próprios clientes estão a pedir mais em termos de produto e, com esse feedback, é possível a empresa enriquecer o seu produto e serviço”

 

“Não faz qualquer sentido investirmos num software onde, depois, vamos ter pessoas a transferir informações de um lado para o outro. São atividades que não acrescentam valor e vão promover a ineficiência e criar interrupções”


João Sá da Costa, Data Analytics & AI Manager, Noesis

João Sá da Costa, Data Analytics & AI Manager, Noesis: “Já lá vai o tempo em que o software de gestão era uma coisa muita fechada; tinha o seu valor dentro da empresa, mas, hoje, o software tem de ser um agregador de forma a informação fluir entre os colaboradores, a conseguirmos ter uma unificação dos dados que, depois, vai permitir às empresas serem mais competitivas, prever alguns riscos, otimizar as suas qualidades na atividade”

Luís Graça, Senior Business Development Specialist, SAS: “O software tem de se alinhar com os objetivos estratégicos da organização. Utilizando uma analogia do corpo humano e dos vários órgãos, [o software] tem de servir um propósito; todos estes sistemas têm de ter um propósito de servir a organização e não de os sistemas serem quase o ponto central da vida da organização. Depois, a interoperabilidade; pegando na mesma analogia, o sangue como elemento de vida da organização e podemos estar a falar dos dados do cliente ou da qualidade dos produtos”

Os silos de informação e a falta de formação dos colaboradores - de um modo geral - são um problema para a adoção de novo software no seio das empresas? Como é que se pode ultrapassar este tema?

Filipe Marcelino, Bravantic: “Os silos de informação são um problema nas empresas. Significa que os seus próprios colaboradores não têm uma visão daquilo que é a big picture da empresa, qual é o funcionamento global da empresa e não percebem, muitas vezes, quais são os impactos das suas ações. Sem saberem qual é o real funcionamento, podem estar a tomar decisões erradamente e, por isso mesmo, é necessário existir formação, existir consciencialização que o trabalho deles não só é importante para a empresa, mas também tem um impacto no seu funcionamento”

João Sá da Costa, Noesis: “Os silos e a falta de informação ainda são uma realidade das pequenas e das grandes empresas. É fundamental consciencializar os colaboradores; a formação é muito importante para entenderem as vantagens de existir uma transparência, se puder identificar o processo, que exista uma partilha do conhecimento e que se tente acabar com esses silos. A informação tem de fluir, tem de se obter essa transparência para que, daí, se possam tirar as eficiências e quebrar essas barreiras”

“Na interação entre humano e máquina, devemos deixar para o humano as decisões complexas e deixamos para a máquina aquilo que são decisões relativamente simples e de baixo impacto”


Luís Graça, Senior Business Development Specialist, SAS

 

Luís Graça, SAS: “Por vezes, existe um grande foco no ERP ou no CRM, como se esses fossem os elementos centrais da organização, quando o que estamos à procura é da visão, por exemplo, do volume de vendas que existe na organização e que haja uma unidade que seja definida de forma unitária. O tema de interoperabilidade entre sistemas é fulcral para atingir os objetivos de negócio das organizações”

Carlos Latourrette, Latourrette Consulting: “É preciso formar não apenas o utilizador final, mas toda a empresa, desde a área de management até todas as áreas técnicas que implementam as soluções. As empresas de maior dimensão podem ter departamentos de IT de centenas de pessoas, mas o mundo das PME ou não temos departamento de IT ou temos muito poucas pessoas. Falta uma camada de formação muito grande tanto para o top management, como para quem implementa as soluções dentro das organizações”

Como é que o software se integra com as plataformas de dados e qual o impacto de tecnologias como inteligência artificial e machine learning na respstiva estratégia das organizações?

João Sá da Costa, Noesis: “O software tem um papel agregador; é suposto refletir todo o processo que os diversos colaboradores executam nas diversas atividades, refletindo-se em dados, em informação o mais detalhada e fluída possível para que não existam interrupções. Depois, vamos contar uma história com esses dados e antes mesmo de utilizarmos inteligência artificial e machine learning – que são peças fundamentais – acreditamos que, antes disso, vamos tentar ver e entender melhor essa história através de process mining”

Luís Graça, SAS: “É vital ir colher dados ao software empresarial nas suas várias dimensões. Não são raros os casos de clientes portugueses – e não só – que, muitas vezes, até têm equipamentos instrumentados e depois não fazemos nada com esses dados, nem sequer uma análise mais histórica de comportamentos – seja de clientes ou de uma unidade industrial – e não compreender os dados de uma forma mais preditiva ou mesmo prescritiva”

Carlos Latourrette, Latourrette Consulting: “Nada disto se pode separar; só existe software para tratar dados porque se não, não servia para nada. Sabemos que consumimos componentes ou ferramentas baseados em inteligência artificial todos os dias; isto já faz parte do nosso dia-a-dia. Essa inteligência artificial está baseada em dados e comportamentos. A verdade é que esta dinâmica de embeber de IA nos softwares empresariais ainda não entrou num caminho de grande evolução, mas é importante darmos este alerta de que qualquer empresa que não tenha em cima da mesa uma ideia mais ou menos clara do que quer fazer em termos de inteligência artificial está com um problema gigante de sobrevivência”

Filipe Marcelino, Bravantic: “Os dados, hoje, são o centro de qualquer negócio. Também acontece muitas vezes termos dados que não utilizamos e que só depois de as coisas acontecerem é que pensamos que podíamos ter feito alguma coisa com isto, ou podíamos ter alterado o nosso segmento de mercado e ter feito algo diferente. A inteligência artificial e o machine learning são extremamente importantes”

Qual é o futuro da analítica no seio das organizações?

Luís Graça, SAS: “A democratização da analítica como um todo inclui temas como a inteligência artificial – que consideramos vitais para problemas mais complexos, mas achamos que é possível extrair valor de modelos estatísticos mais antigos. É preciso criar competências nas organizações, até porque arranjar cientistas de dados é difícil no contexto atual. No contexto nacional, falta alguma maturidade analítica e estatística em muitas organizações, apesar de já haver processos – que, no entanto, estão muito restritos a funções muito específicas – e de onde se pode retirar mais valor”

Filipe Marcelino, Bravantic: “Vejo o tema da analítica como o suporte à própria formação dos colaboradores no sentido de a própria organização demonstrar o que está mal nos seus processos, seja para os colaboradores entenderem porque é que determinada situação deve ser feita por outra metodologia. Centramo-nos nos dados – que são vitais na empresa – e a analítica é mais um tema importante para os processos”

João Sá da Costa, Noesis: “É uma área cada vez mais vital nas empresas. Uma das barreiras que ainda existe é os sistemas legacy e os tais silos. É preciso arrumar a casa primeiro. Já existem tecnologias que já têm uma série de ferramentas e formas como é que a casa poderá ser arrumada; já não é necessário sentarmo-nos com as pessoas. Estas ferramentas fazem uma leitura e já demonstram onde as empresas estão”

Se o número de aplicações aumenta, também passa a ser necessário que essas aplicações 'falem' entre si. A integração e a interoperabilidade das aplicações são um tema central na escolha de um novo software?

 

“Podemos resumir tudo em reutilização de processos, eficiência e escalabilidade. Reutilização de processos exatamente pela análise dos dados e ferramentas de low-code que são um outro ramo do software e da implementação”


Filipe Marcelino, Senior Manager Digital Solutions, Bravantic

 

Filipe Marcelino, Bravantic: “Diria que é o segundo ponto de escolha do software; o primeiro é se faz aquilo que é necessário e a seguir é se tem a interoperabilidade necessária. Se fosse possível, já teria sido feita uma solução que faz tudo. Como tal, cada aplicação é boa naquilo que faz, mas, do ponto de vista da organização, são necessários vários softwares. Como temos vindo a falar, a informação e os dados são o mais importante dentro da organização; é de extrema importância que o software tenha uma camada de interoperabilidade”

Carlos Latourrette, Latourrette Consulting: “Só há silos quando não há interoperabilidade. Ter várias aplicações não tem problema nenhum se elas falarem entre si. Para mim, este não é o segundo ponto de escolha de um software; é o primeiro. Se não tem características de interoperabilidade, não entra dentro de casa, vamos buscar o segundo melhor software, que seja mais aberto, porque os custos que temos de integrar soluções é dramático. O custo de passar do ponto A para o ponto B é, muitas vezes, integrar sistemas. Depois, não se avança porque não se consegue integrar”

João Sá da Costa, Noesis: “É mandatório que exista essa capacidade de interoperabilidade. Não faz qualquer sentido investirmos num software onde, depois, vamos ter pessoas a transferir informações de um lado para o outro. São atividades que não acrescentam valor e vão promover a ineficiência e criar interrupções. Não vamos ter nunca uma correta análise. Depois, os automatismos que vamos criar são para colmatar estas ineficiências. Se vou investir, é mandatório que exista esta capacidade no software”

A automatização de processos é cada vez mais importante, até para libertar os colaboradores de tarefas repetitivas. Como é que este mercado está a evoluir e o que é que as organizações estão a apostar dentro deste segmento?

Carlos Latourrette, Latourrette Consulting: “Hoje, temos as fábricas muito automatizadas, mas vemos as torres de escritório – as fábricas do séc. XXI – totalmente aos papéis. O que estamos agora a falar é que essa automatização de processos deve, também, vir para os escritórios, é preciso olhar para essas atividades. Os benefícios de ter uma abordagem por processos, vai-se ver como é que as coisas hoje são feitas, quais são as atividades das pessoas, os pontos de integração dos softwares e como é que se podem eliminar tarefas redundantes e repetitivas”

Filipe Marcelino, Bravantic: “A automatização é um dos temas fulcrais. Do ponto de vista da pessoa, temos de eliminar os processos repetitivos e serem rentabilizadas naquilo que melhor fazem – que é muitas vezes na tomada de decisão. Todos sabemos que na grande maioria das empresas, estas tarefas repetitivas resumem-se a ficheiros de Excel. A automatização de processos tem um papel fulcral na transferência de informação em sistemas legacy”

Luís Graça, SAS: “Há um conjunto de atividades que já é totalmente automatizado. No setor financeiro, a análise de credit score, o risco de não pagamento de um cliente já é feito de forma automática. Na interação entre humano e máquina, devemos deixar para o humano as decisões complexas e deixamos para a máquina aquilo que são decisões relativamente simples e de baixo impacto, sempre que a análise devida dessas automatizações”

Com o crescimento da necessidade de software, houve uma alteração no modo de consumo das soluções, existindo o tema do SaaS e do licenciamento de software, muito importante para qualquer empresa. O que é que as organizações nacionais estão a procurar mais hoje? O licenciamento tradicional ou o modelo SaaS? As organizações preferem ser elas próprias as gestoras desses serviços ou entregam a terceiros?

João Sá da Costa, Noesis: “Temos notado uma migração do software atual para um modelo as-a-Service. É algo que, por um lado, as empresas decidem porque as liberta do ferro, do custo que é manter toda essa infraestrutura física e, também, das pessoas. Quando mudamos para um modelo de serviço, as coisas ficam muito mais fáceis para as empresas e entregam essa gestão a terceiros e focam-se naquilo que é realmente interessa”

Luís Graça, SAS: “Sendo inegável que a maioria do mercado está à procura de soluções cloud ou modelos de Software-as-a-Service, também é verdade que alguns tentam manter alguns sistemas on-premises. Vemos cada vez mais, associado aos benefícios da cloud e destes novos modelos, uma abordagem de ‘elefantes brancos’; todas as organizações querem arrumar a casa, mas, dada a volatilidade do mercado, é incomportável um projeto a dois anos”

“As empresas de maior dimensão podem ter departamentos de IT de centenas de pessoas, mas o mundo das PME ou não tem departamento de IT ou tem muito poucas pessoas”


Carlos Latourrette, CEO, Latourrette Consulting

 

 

Carlos Latourrette, Latourrette Consulting: “Um dos temas é a maneira como pagamos, até porque é um dos principais drivers na adoção generalizada deste tipo de abordagens. Existem, hoje, empresas a vender soluções de software que até podem ser licenciamento on-premises, mas o método de pagamento é por mensalidades, muito associado ao Software-as-a-Service, até porque as empresas não se querem comprometer com grandes investimentos à cabeça”

Qual é o futuro - a curto prazo - do mercado de software empresarial?

Luís Graça, SAS: “É importante a adição de novos modelos de apoio à decisão, que pode ser a inteligência artificial, mas também modelos mais clássicos que podem dar resultados interessantes. Começamos a ver que estes temas começam a ganhar capacidades analíticas e ainda bem, porque existem funções que precisam de tomar decisões diretamente no sistema, mas também é preciso ter capacidades analíticas a nível da organização”

João Sá da Costa, Noesis: “O futuro passa por estar mais próximo do utilizador, por caminhar para uma forma de trabalhar cada vez mais global e sem barreiras a qualquer nível, potenciando o detalhe dos dados. Com isso, as empresas conseguem ter uma boa analítica e conseguem ser ainda melhores do que são à data”

Carlos Latourrette, Latourrette Consulting: “Esta perspetiva do software empresarial tem um grande contributo de juntar as soluções que existem ou de integrar melhor tudo o que existe para que as empresas tenham um retorno do investimento que fizeram ao longo dos anos. Olhando nesta perspetiva, é uma forma de adaptar as soluções mais verticais ao negócio em concreto para elas puderem criar um valor próprio”

Filipe Marcelino, Bravantic: “Podemos resumir tudo em reutilização de processos, eficiência e escalabilidade. Reutilização de processos exatamente pela análise dos dados e ferramentas de low-code que são um outro ramo do software e da implementação. A eficiência através do automatismo de processos que reduz drasticamente o erro humano. A escalabilidade da utilização de SaaS, da cloud, de forma a retirar a capacidade da própria organização ter de responder a um pico de produção”

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