O ano passado foi de grandes avanços em inteligência artificial e machine learning. Mas 2017 poderá trazer ainda mais. Eis cinco elementos-chave a ter em conta
Reforço positivoA vitória histórica da AlphaGo, o software de inteligência artificial desenvolvido pela Google, contra um dos maiores jogadores de sempre do jogo de tabuleiro Go [inventado na China há mais de 2500 anos], Lee Sedol, foi um marco no campo da inteligência artificial (IA), em particular para a técnica conhecida como aprendizagem por reforço profundo. A aprendizagem por reforço profundo colhe inspiração na forma como os animais aprendem sobre o modo como determinados comportamentos tendem a ter um resultado positivo ou negativo. Recorrendo a esta abordagem, um computador pode, por assim dizer, perceber como navegar num labirinto por tentativa e erro e, posteriormente, associar o resultado positivo – sair do labirinto – às ações que o levaram a tal. Isto permite que uma máquina aprenda sem instruções ou sequer exemplos explícitos. A ideia tem sido falada há décadas, mas a combinação com grandes e profundas redes neurais entrega o poder necessário para que funcionem em problemas realmente complexos (como o jogo Go). Através de experimentação contínua, bem como análise de jogos anteriores, o AlphaGo conseguiu aprender a jogar sozinho e com um elevado nível de perícia. Espera-se que o reforço de aprendizagem continue, agora, a provar ser útil em muitas situações reais. As recentes simulações em diversos ambientes devem estimular o progresso dos algoritmos necessários a ampliar as capacidades que os computadores podem adquirir por esta via. Em 2017, devem registar-se tentativas de aplicar o reforço de aprendizagem a condução autónoma e robótica industrial. A Google já enalteceu ter recorrido a capacidades profundas de reforço de aprendizagem para tornar os seus data centers mais eficientes. A abordagem, porém, mantém-se experimental e ainda exige simulações morosas, pelo que será interessante observar como podem ser implementadas. Redes neurais Em dueloNuma recente reunião académica realizada em Barcelona, a conferência “Neural Information Processing Systems”, muita da agitação gerada deveu-se a uma nova técnica de machine learning, conhecida como “redes adversárias generativas”. Desenvolvidas por por Ian Goodfellow, as Generative Adversarial Networks (GANs) são sistemas que consistem em duas redes: uma que gera novos dados depois de aprender a partir de um training set e outra que tenta discriminar entre dados verdadeiros e falsos. Ao trabalharem em conjunto, estas redes conseguem produzir dados sintéticos muito realistas. A abordagem pode ser utilizada para gerar cenários de videojogos, para eliminar o desfoque numa gravação de vídeo ou para aplicar mudanças estilísticas a designs gerados por computador. Yoshua Bengio, um dos principais especialistas mundiais em machine learning, apontou na referida conferência que a abordagem é particularmente entusiasmante para unlabeled data – algo que muitos acreditam que pode ser a chave para tornar os computadores muito mais inteligentes nos próximos anos. O Boom da IA na ChinaEste também pode ser o ano em que a China começa a tornar-se num grande ator no campo da IA. A indústria tecnológica do país está a deixar de copiar as empresas ocidentais e já identificou a IA e o machine learning como as próximas grandes áreas de inovação. A principal empresa de motor de busca, a Baidu, tem um laboratório dedicado a IA há já algum tempo, e está a colher os benefícios em termos de melhorias tecnológicas, como o reconhecimento de voz e processamento de linguagem natural. Outros intervenientes estão agora a tentar acompanhar esta evolução. A Tencent, que disponibiliza uma aplicação móvel de mensagens e networking, a WeChat, inaugurou um laboratório de IA o ano passado e a empresa tem estado empenhada no recrutamento de talento. Didi, o gigante das viagens partilhadas que comprou as operações da Uber na China no início deste ano, também está a construir um laboratório e a trabalhar nos seus próprios carros autónomos. Os investidores chineses estão agora a apostar em startups de IA e o governo chinês assinalou o desejo de ver a indústria de IA do país a florescer, comprometendo-se a investir 15 mil milhões de dólares até 2018. Aprender a linguagemBasta perguntar a investigadores de AI qual a sua próxima grande meta e, muito provavelmente, a resposta será “a linguagem”. A esperança é a de que as técnicas que produziram evoluções espetaculares em reconhecimento de imagem e de voz, entre outras áreas, possam vir a ajudar os computadores a analisar e gerar linguagem mais eficazmente. Este é, desde há muito, um objetivo em inteligência artificial – a possibilidade dos computadores comunicarem e interagirem connosco pela linguagem. Uma melhor compreensão da mesma tornaria as máquinas bastante mais úteis. O desafio, porém, é tremendo, dada a complexidade, subtileza e poder da linguagem. Não espere, no entanto, manter uma conversa profunda com o seu smartphone nos próximos tempos. Certo é que há incursões impressionantes a acontecer e esperam-se avanços adicionais nesta área em 2017. Reação ao hypeEm 2016, além de avanços genuínos e de novas e entusiasmantes aplicações, o hype em torno da AI elevou-se particularmente. Apesar de muitos acreditarem no valor subjacente às tecnologias que estão atualmente a ser desenvolvidas, é difícil escapar à sensação de que toda a agitação em torno da AI está a ficar um pouco fora de controlo, o que está a irritar ligeiramente os investigadores desta área. Um dos principais problemas é o facto de todo o hype conduzir inevitavelmente a uma sensação de desilusão se se verificar a não concretização dos grandes avanços, levando a que as startups falhem e a que os investimentos arrefeçam. Talvez 2017 inclua algum tipo de contra-resposta ao hype em torno da IA – e talvez isso não seja assim tão mau. |