O e-commerce tem vindo a crescer nos últimos anos, mas a situação pandémica fez com que o número explodisse. Mas, afinal, o que é que acontece depois de se efetuar a compra? Quais são os caminhos que o produto percorre desde o armazém até à mão do cliente? Quais são os sistemas que suportam esta realidade?
Por esta altura, já todos sabem que uma pandemia teve – e tem – lugar e que alterou por completo a maneira como vivemos. O trabalho remoto, que até há uns meses era um privilégio para a maioria dos colaboradores, passou a ser uma necessidade para a generalidade das organizações. Com o isolamento social e os diferentes bloqueios a serem levantados, as empresas optam por manter modelos totalmente remotos ou mistos. Da mesma maneira que o modo de trabalhar foi alterado, o modo de comprar os mais variados produtos também foi. Em termos gerais, o e-commerce regista crescimentos quase todos os anos. Com a pandemia causada pelo novo Coronavírus, os números dispararam. Em Portugal, a SIBS divulgou que o e-commerce tinha um peso de 9% no total das compras no 'antigo normal'. Durante o período de confinamento, esse peso subiu para 14%. A impossibilidade de se deslocar a lojas de bens não essenciais, uma vez que estavam fechadas, a escassez de produtos em estabelecimentos de primeira necessidade ou, simplesmente, as longas filas de entrada e pagamento nas lojas, levaram o e-commerce a crescer; em Itália, a 8 de março, as vendas online registaram um aumento de 90% em comparação com o mesmo período de 2019, por exemplo. À semelhança de outros setores, também o e-commerce não vai voltar atrás. Os avanços feitos durante a pandemia vão manter-se para lá da atual situação. Quem, por força das necessidades, experimentou comprar online um determinado produto pela primeira vez, estará mais predisposto a repetir a experiência. Gerir a cadeia de valorAssegurar que um produto vai do ponto A ao ponto B não é uma tarefa fácil. A gestão de todos os bens e serviços é um processo que tem de ser o mais preciso possível, sem margem de erros, sob pena de se perderem produtos e, em última análise, clientes. O termo supply chain management envolve as várias atividades associadas com a gestão do procurement da empresa com o objetivo de reduzir custos, melhorar a eficiência e satisfazer a procura. Há custos associados para atingir estes objetivos e é essencial que as organizações façam o planeamento e implementem planos ou estratégias na cadeia de fornecimento que permitam determinar os níveis de serviço e as metas de compras a curto e longo prazo. Depois de implementada a estratégia, as organizações passam a poder tomar decisões racionais e informadas sobre como as matérias-primas devem ser adquiridas e os produtos finais entregues aos seus clientes. Uma estratégia de gestão da cadeia de valor ajuda os gestores a determinar a ação apropriada quando algo não ocorrer de acordo com o plano, como o que fazer quando um fornecedor entrega uma matéria-prima atrasada ou como lidar com problemas de qualidade. Cada organização tem a sua própria estratégia para gerir a cadeia de valor, mas há elementos iguais ou semelhantes a todas que devem ser tidas em conta. A estrutura da cadeia de valor é um ponto importante. A organização tem que ter em conta as estruturas físicas, como instalações de fabrico, armazenagem, pontos de venda e localizações - Carla Pereira - Vice-Presidente da ACEPI dos clientes, para além da logística, sobre onde e como cada um destes pontos é estruturado. Em algumas empresas com uma política de compromisso social mais vincada precisa de identificar os padrões legais e éticos relacionados com a aquisição de determinados produtos ou matérias-primas de modo a garantir que a empresa cumpre com a sua responsabilidade corporativa e/ou compromissos ambientais. Depois, também é necessário adotar sistemas para monitorizar os stocks de produtos, como a utilização de códigos de barras ou de QR Codes, ou dispositivos de IoT que permitem rastrear os locais e os movimentos. As soluções de software têm aqui um papel especialmente importante, uma vez que são elas que dão a visibilidade da cadeia de fornecimento. Assim, a integração de uma boa solução de software de gestão da cadeia de valor com os outros sistemas corporativos é especialmente relevante. Segredo do negócioSegundo um estudo da Deloitte, a maioria das empresas que têm uma cadeia de fornecimento otimizada conseguem um crescimento de receita superior à média dentro da sua indústria. A gestão da cadeia de fornecimento tem um enorme impacto no sucesso do negócio. Uma boa gestão da cadeia de abastecimento pode melhorar diretamente o serviço aos clientes. É sabido que o supply chain management é uma parte integral para a maioria dos negócios que fornecem serviços a clientes – sejam individuais ou corporativos – e é essencial para o sucesso da organização e da satisfação dos clientes. Por um lado, as soluções de gestão da cadeia de valor podem diminuir os custos operacionais. Por outro, podem melhorar os serviços ao cliente. As organizações preferem a distribuição rápida de produtos e matérias-primas mais caras para evitar inventários caros. Simultaneamente, uma cadeia de fornecimento adequada distribui os materiais pelos locais necessários – como fábricas – e evita custos que podem ocorrer devido a atrasos. Ao mesmo tempo, os clientes esperam a entrega correta dos pedidos e no tempo que foi inicialmente previsto. Os serviços de pós-venda são, também, um dos pontos mais importantes de qualquer negócio, uma vez que os consumidores esperam que qualquer problema que possa surgir, seja resolvido rapidamente. Tudo começa com um cliqueComprar um produto no computador ou smartphone e uma semana depois – muitas vezes menos – aparecer à porta não é um truque de magia. É fruto de um trabalho pensado ao detalhe de maneira a que nada falhe, que esteja operacional 24 sobre 24 horas e que proporcione uma experiência positiva a quem o utiliza. Uma infraestrutura de e-commerce precisa de vários componentes de hardware, software e redes., como a Internet (componentes de acesso e redes), web (servidores e suporte), software, catálogos eletrónicos e design das páginas web. Entre o que é necessário para manter uma loja online virada para o consumidor encontra-se um catálogo, capacidades para selecionar os produtos a comprar (o ‘carrinho’), processos de transação, ferramentas para popular o catálogo da loja e facilitar a escolha dos destaques da loja. Depois, qualquer software de e-commerce tem de ser integrado com sistemas já existentes, como bases de dados e software de processamento de transações. Depois de efetuada e paga a compra, os produtos começam uma autêntica viagem até chegarem às mãos dos clientes. No caso do Continente Online, Pedro Santos, Diretor de E-Commerce da Sonae MC, explica que “após a colocação da encomenda pelo cliente, esta é transferida automaticamente para um dos pontos de preparação”. Depois, é feito o picking dos produtos. Aqui, recorrem-se a “processos, sistemas e equipamentos que maximizam a qualidade, a segurança para o cliente e a eficiência operacional”. As encomendas são posteriormente acondicionadas de acordo com as suas características e, de acordo com a tipologia de transporte e proximidade da entrega, é agregada, transportada e entregue aos clientes. “Todo este processo é suportado e monitorizado com sistemas dedicados para que ocorra com a maior qualidade e eficiência”, afirma Pedro Santos. A dificuldade de montar uma loja online depende da sua dimensão. Para alguém que apenas quer vender alguns produtos, há soluções desenvolvidas que, em poucos minutos, permitem ter uma loja totalmente operacional. Depois, há soluções intermédias que necessitam da compra de hardware e algumas competências para preparar uma loja online, algo que poderá levar dias até que fique pronta. Por fim, as grandes empresas com grandes tráfegos e volumes de transação precisam de especialistas in-house e uma grande integração de sistemas para que funcionem da melhor maneira. No caso do Continente Online, a “eficiência da operação” exige “um sistema alargado, mas muito integrado, de vários componentes que asseguram estas características em processos como a disponibilização de produtos para compra, a indicação dos períodos de entrega disponíveis ou processos de picking, as rotas de entrega ou o serviço ao cliente”. DesafiosComo em tudo, há desafios que as empresas têm de ultrapassar para que a sua loja online tenha sucesso. O downtime, os tempos de carregamento e os ataques cibernéticos estão entre esses desafios. Através da cloud, as empresas podem implementar auto-scalling, principalmente o preditivo, podem adicionar ou remover recursos da ‘frente de loja’ digital baseada no tráfego do site em tempo real. A tecnologia de auto-scalling preditivo permite que as empresas estejam à frente das mudanças rápidas da procura, levando a que tenham a capacidade exata necessária para assegurar uma disponibilidade do site consistente, assim como custos de gestão melhorados. Os tempos de carregamento das páginas podem ser um problema. Se uma página demorar muito a carregar, os clientes podem desistir da sua compra e gastar o seu dinheiro num concorrente. Há algumas práticas que podem otimizar significativamente o tempo de carregamento. A utilização de Content Delivery Networks (CDN), técnicas de otimização avançadas de páginas e conteúdo e uma cache de site dinâmica são algumas das práticas que podem diminuir o tempo de carregamento para os clientes. Um outro desafio – similar a qualquer organização moderna – é a ameaça de ciberataques. Com as ciberameaças cada vez mais maliciosas e frequentes, há uma necessidade de uma segurança de 360 graus. É relevante investir num stack de soluções que conta com as mais recentes gerações de aplicações de firewall, assim como proteções avançadas, como bot management, e monitorização de integridade de ficheiros. Pedro Santos afirma que para assegurar que uma loja online está ativa o máximo de tempo possível, é obrigatório “um desenho de arquitetura eficiente, uma infraestrutura robusta e com uma monitorização muito eficaz”. O Diretor de E-Commerce da Sonae MC, explica, também, que “a gestão de uma loja online exige a combinação de uma proposta de valor forte para os clientes, uma infraestrutura (de front e back end) ágil e escalável, processos robustos e consistentes num contexto de evolução permanente e significativa”. Para as empresas que não são exclusivamente online, e que também têm lojas físicas tradicionais, há um desafio acrescido: manter a qualidade de serviço ao longo dos vários canais. No caso da Sonae MC, que gere as lojas Continente, “o e-commerce representa um canal adicional, uma oportunidade de estarmos com os nossos clientes nos mesmos canais onde estão”. Em comparação com os concorrentes pure-players, existe “necessariamente o desafio adicional de consistência entre canais”, até porque “independentemente do canal utilizado, o cliente é único”. A viagemNem todas as empresas têm capacidade de entrega dos seus produtos. A maioria depende de uma empresa de transporte para fazer chegar os seus produtos do armazém até à mão dos seus clientes. Um estudo do DPD Group, publicado em janeiro de 2020, revela que “a entrega é um passo decisivo na experiência de compra online, momento no qual a experiência digital se torna tangível”. A entrega também é alvo de expetativas por parte dos consumidores. De acordo com o mesmo estudo, os e-shoppers regulares portugueses têm as mesmas expetativas em relação à entrega que os seus pares europeus, como a visibilidade – ou seja, a informação em tempo real –, a flexibilidade – como várias opções de entrega e possibilidade de alterar a entrega – e a precisão – conhecer ou selecionar o dia e o horário de entrega. Carla Pereira, Vice-Presidente da ACEPI – Associação da Economia Digital, refere que “as pessoas consideram, ainda hoje, que quem vai recolher a encomenda é quem vai entregar ao cliente”, algo que seria impossível de fazer, uma vez que obrigaria as empresas de transporte a ter “milhões de carros”. Depois de fazer a encomenda que viaja através de empresas de transporte, existe um ID único que, tal como os Cartões de Cidadão, não há dois iguais. Isto significa que as empresas podem ‘ler as coisas uns dos outros’ de forma a que as guias sejam o mais uniforme possíveis. Este ID único facilita as vendas internacionais e as integrações com operadores internacionais. Se um cidadão residente em Portugal efetuar uma encomenda de um produto que está localizado na China, há uma empresa de transporte responsável para que o produto saia do armazém do vendedor na China e chegue ao ponto de entrega do cliente em Portugal. A empresa de transporte pode, dependendo da maneira como funciona, delegar o transporte em si a outras empresas subcontratadas ou efetuar o transporte através dos seus variados veículos. Uma encomenda que venha da China para Portugal tem um caminho mais ou menos definido: vai para um armazém em Hong Kong, viaja num armazém no centro da Europa – habitualmente na Alemanha ou em França – e, a partir daí, vai para os vários armazéns de distribuição local, como Portugal, sendo enviado posteriormente para o ponto de entrega definido pelo cliente. O track & trace é um dos serviços mais importantes para os consumidores. Geralmente, depois de uma encomenda ser feita, o cliente recebe um email onde consta toda a informação relativamente à sua encomenda e uma ligação que permite seguir a encomenda, em que armazéns está, que já saiu, por exemplo, da China e que já chegou a Portugal. “Num cenário simplificado de uma encomenda nacional, ainda assim há todas estas indicações”, explica Carla Pereira. “Há informação de recolha, há informação do carregamento que vem no camião de ligação, depois há a chegada ao depot de destino – as entidades têm depots, hubs ou agências locais, como queiramos chamar – onde vai ser feito o carregamento das várias encomendas”, afirma. Primeiro, há uma “triagem de concentração”, onde se colocam as várias encomendas para uma determinada região. Depois, há a “triagem de dispersão”, uma “capilaridade muito fina” para entregar as encomendas nos mais variados códigos postais. IntegraçãoAs empresas de transporte têm plugins que podem ser integrados nos sistemas das lojas online para que seja feita automaticamente a reserva do serviço de transporte. Não é possível obrigar “uma empresa que tem dez, ou 15, ou 20, ou 300, ou milhares de encomendas por dia a fazer o push das informações e muito menos a estar a carregar manualmente todos os seus contactos e todos os clientes”. Na prática, isto faz com que a maioria das entidades façam uma integração nos seus serviços de venda. “Esta integração permite, geralmente, pelo menos duas coisas”, afirma Carla Pereira. “Uma é que o shipping esteja integrado com a forma de fazer a faturação, o que significa que os operadores vão poder saber a informação. Um outro processo que geralmente também acontece aqui, paralelamente, é a questão do trace, que permite depois também integrar – até dentro do site de quem está a vender – o track & trace da encomenda”. Integrar estes plugins é, habitualmente, um processo que demora minutos. Naturalmente que há casos e casos – a dimensão da empresa e as competências de quem gere as lojas é uma delas –, mas é um caminho e a pessoa que faz de integrador acaba por descarregar o plugin e coloca-o a funcionar em minutos. No entanto, as integrações grandes dependem de dias, ou mesmo de meses, até estarem terminadas. Manter o caminhoSe é verdade que o e-commerce tem crescido nos últimos anos e ainda mais com a pandemia da COVID-19, é igualmente verdade que não vai voltar atrás. A atual situação conquistou novos clientes que ou faziam compras online esporadicamente, ou que não compravam um tipo de produto online pela necessidade de o ver fisicamente primeiro ou porque simplesmente não queriam fazer compras através do seu dispositivo. Cabe agora às empresas reterem esses novos clientes que, pela força das circunstâncias, foram forçados a abrir-se a um novo mundo ou a utilizar mais um serviço que já conheciam. |