Feita a escolha do prato apetecido, a encomenda é colocada na App e o processo de confeção desencadeado. Em breve, aparece a indicação de que o restaurante está a trabalhar afanosamente no nosso pedido e, passado o tempo de elaboração, é indicado quem nos virá fazer a entrega, em que veículo se desloca e qual o tempo previsto para a chegada
Daí para a frente, a nossa preocupação é se a comida chegará quente ou não, e provavelmente, muito poucos dos clientes destes serviços perderão um minuto sequer com as plataformas que lhes servem de suporte. Em geral, o que é visível é a App e pouco é sabido sobre como funcionam tais sistemas que, de forma cada vez mais consistente, permitem a entrega de um almoço ou um jantar com qualidade surpreendentemente uniforme, tendo em conta todos os imponderáveis que acarretam. A verdade é que em serviços como os da Uber Eats e da Glovo é fácil esquecer a complexidade digital, já que a face visível é o mais possível “mundo físico” com grande dose de trabalho manual: refeições elaboradas artesanalmente em restaurantes e entregas em bicicleta. Mas, pelo meio, há estimação de tempos de preparação, tempo de viagem, tempo total de entrega, otimização de rotas em cidades congestionadas, escolha de estafetas, monitorização em tempo real de trajetos, entre muitos outros fatores. O processamento por detrás de tais Apps é sofisticado e tanto mais espantoso que seja tão invisível para os utilizadores finais, que afinal apenas conhecem o resultado final: uma entrega de comida quente à porta de casa. Este processamento exige equipas de cientistas e engenheiros de dados, exige treino e deployment de modelos de machine learning, como atualização constante, exige os mais atuais serviços na cloud para a escala necessária ao serviço de tantos clientes em simultâneo. De algum modo, estes serviços, estas Apps, são um dos mais visíveis casos de estudo para o moderno processamento de grandes volumes de dados (Big Data). Na maioria dos serviços mais usados atualmente, baseados em aplicações móveis, é praticamente incontornável que tenham na origem plataformas de dados capazes de responder em milissegundos, e que tirem partido de modelos construídos para aprendizagem de máquina (machine learning). Plataformas de dados estas que, consoante as capacidades e disponibilidades das empresas, podem ser detidas pelas próprias, ou antes – e, em boa verdade, cada vez mais – baseados em plataformas de cloud. Qualquer um dos grandes fornecedores de clouds públicas tem vindo a apostar na criação de serviços ditos geridos, que permitem com relativa rapidez, montar soluções de grande escalabilidade, isto é, que podem crescer para níveis onde é necessário suportar – por exemplo – as entregas da Glovo, que é baseada inteiramente em cloud, especificamente na plataforma da Amazon, Amazon Web Services (AWS), numa escolha e tipo de plataforma com muito em comum com outras empresas da economia da partilha, como a AirBnB, por exemplo. É mérito dos fornecedores de tais aplicações que a complexidade subjacente seja deste modo tão oculta dos utilizadores. Muitos deles, e os serviços de entregas são um exemplo, têm equipas de cientistas de dados apenas dedicadas à telemetria das aplicações, isto é, equipas que apenas se dedicam a analisar como os clientes as utilizam, como se comportam relativamente a alterações na interface, como é o histórico de interações, em geral, como podem melhorar a experiência de uso. Tudo isto é, mais uma vez, baseado em dados, que são gerados na App, transmitidos para uma plataforma gerida pela própria empresa, caso da Uber, ou na cloud, caso da Glovo, e analisados em tempo real ou perto disso. Na verdade, a cada uma das Apps mais populares corresponde uma estrutura destas, de tratamento sofisticado e complexo de dados, desde a parte de recolha das verdadeiras torrentes geradas por cada utilizador, até aos processos de análise e previsão, com base em modelos de machine learning, a parte hoje onde se concentra uma parte significativa da diferenciação da experiência do cliente. E este é um grande ponto de comparação para os clientes face à experiência com outras empresas. Porque estas Apps que fazem a interface com o mundo real e seus imponderáveis são mais palpáveis nos resultados do que apenas prestam funções de âmbito digital, digamos, como armazenamento de ficheiros ou transformação de imagens. Estas determinam a experiência do utilizador com outros prestadores de serviços e permitem acompanhar confeção e entrega em tempo real de produtos que têm pouco tempo de vida útil ou que, pelo menos, têm consigo a expectativa de que podem ser consumidos em condições ótimas ainda que se considerem que dependem de uma série de fatores que estão fora do controlo do prestador de serviço da App. A App e o respetivo sistema subjacente têm, na verdade, de ser capazes de prever o futuro e adaptar as expetativas dos utilizadores permanentemente (até de, de forma algo ardilosa, se mostrarem pesarosas quando uma entrega se atrasa, como se se tratasse efetivamente de evento raro, quase impossível de acontecer). Para os utilizadores finais, a chegada do almoço perfeito à porta é um milagre das artes de bem cozinhar e de bem entregar. Para todos os que olham para as plataformas de suporte, não é menos um milagre da arte de bem processar os dados, enquanto estes estão frescos e com as suas melhores propriedades. |