Pedro Martins, CEO e fundador da Singularity Digital Enterprise, aborda a importância de ter dados de confiança que, por sua vez, vão gerar informações de confiança que permitem abordar o mercado com um melhor conhecimento da realidade
Qual é a história da Singularity Digital Enterprise? A Singularity vai fazer quatro anos em novembro. Eu e o Hugo [Cartaxeiro] montámos a empresa com o objetivo de trabalhar os dados. Achávamos que a área de dados tinha um potencial enorme e detetámos que não existia quem trabalhasse de uma forma integrada, aquilo que chamamos os milestones do nosso trabalho. Desde início, e não vamos mudar a estratégia da empresa, focámo-nos naquilo que são os desafios de negócio, utilizar a visualização como um meio de apresentar informação de uma forma rica e simplificar aquilo que é complexo. Depois, usar os algoritmos mais ou menos complexos para potenciar a informação e os dados da empresa. Acho que um desafio para o próximo ano é a informação rigorosa. Em tempos de crise, aquilo que é preciso é informação rigorosa, atempada, para tomar decisões; grande parte das organizações não têm informação ou dados com qualidade. Além disso, não estão disponíveis para tomadas de decisão rápida. Normalmente, são dados que estão com um mês de desfasamento, ou 15 dias, ou três semanas, ou três meses e não estão organizados para que os decisores possam tomar as decisões. Começámos a desenvolver este conceito com uma grande empresa portuguesa e lançámos o produto Power Management Cockpit, que é aquilo que chamamos de The Eye of the Business. Como é que consigo controlar o meu negócio, seja ele uma empresa, um grupo de empresas ou um departamento. Neste projeto, começámos para o conselho de administração do grupo – são 400 empresas – e temos 12 fontes de informação diferentes; organizar aquela informação de uma forma muito simples e intuitiva foi completamente relevante para a situação. Atualmente, a equipa de gestão de topo olha e, em 30 segundos, consegue ver como é que está o negócio de ontem para hoje; é uma alteração de paradigma completamente diferente. O que é que leva uma organização a avançar com um projeto desses? É reconhecer que não tem informação. Grande parte dos gestores, com o aumento de dados e fontes de informação, não têm disponível a informação que gostaria. Quando toma decisões, não sabe se está a tomar com a informação correta, com os dados corretos ou não. Quando fazemos uma plataforma, consigo ver rapidamente qual é o estado da minha empresa hoje, com base em informação que está certificada e correta, porque há um trabalho de certificação desta informação a priori, aquilo que nós chamamos de data lineage. Isso é essencial para a gestão. As empresas que realmente estão preocupadas com o seu negócio, procuram controlar e prever, porque só com informação e dados nos quais se tem confiança é que é possível extrapolar para o futuro, o que é que se pode fazer, onde é que se deve atuar. É essencial. Tivemos um projeto em que a margem do cliente baseava-se numa tabela que tinha sido feita há não sei quantos anos e que ninguém questionava. As margens estavam completamente erradas. As pessoas estão a tomar decisões com base em margens que estavam erradas. Como é que és gestor de uma empresa e estás a tomar decisões com a informação errada? Que tipo de barreiras, de desafios é que enfrentam? A gestão da organização sabe a informação que quer para tomar decisões, para controlar o seu negócio. A grande dificuldade é ir buscar estes dados, o processo de qualidade desta informação, e depois colocar esta informação de uma forma rápida neste tipo de plataformas. Temos uma estratégia de monitorização da informação para perceber de onde vem e porque é que um determinado indicador é interessante, e se eu cruzar este com o outro indicador, se calhar tenho uma informação mais interessante para o meu negócio. Isto envolve trabalhar desde o dado até à qualidade do mesmo com as várias equipas. Por exemplo, no caso da grande empresa que referi, foram 14 equipas diferentes que fazem controlo de gestão; no caso de uma outra empresa, foram três grandes sistemas que tivemos de ir buscar a informação e perceber se ela tinha esses dados. Isto é um trabalho feito com a área de negócio, normalmente, em que envolve a área de IT, mas que é um trabalho exigente. Normalmente como é que a área de IT se posiciona nestes projetos? A área de IT tem um problema: normalmente estão subdimensionadas para a quantidade de desafios; hoje em dia é tudo tecnologia e software. Qualquer coisa que uma organização queira fazer, precisa da área de IT, que não tem os recursos suficientes para fazer. Os departamentos de tecnologia – na grande parte das empresas – estão subdimensionados, exceto empresas que vivem na tecnologia. Salvo as grandes exceções, grande parte dos departamentos de IT não têm mãos a medir, não têm capacidade de conseguir fazer os projetos que têm na lista. Este é um grande desafio. O outro desafio é perceber, sobretudo com os vários sistemas, que são sistemas core onde há informação que está organizada, que já extraem essa informação para fazer os reports trimestrais, e quando tomam a decisão, é perceber se aquela informação que alimenta esses reports está ou não correta. Depois há formas de agilizar este processo. Em três meses – o chamado fast start – é possível fazermos o levantamento do data lineage, olhar, ver onde é que estão os dados críticos, e fazer uma primeira versão. O esforço está em pegar nessa informação que já extraem e reutilizá-la de uma forma diferente de ver esta informação, às necessidades concretas da tomada de decisão. Grande parte dos projetos são feitos em três, quatro meses. São projetos de curta duração em que começamos por extrair e procurar a informação como estão a reportar atualmente. Por isso, não criamos grandes dificuldades de exigir ao IT que faça grandes envolvimentos, até porque já consomem grande parte desta informação. No fundo, adaptamo-nos à forma como a organização faz o report, vamos buscar o que interessa, e criamos esta solução como base. Depois, o que acontece numa segunda fase é olhar para onde podemos ir buscar informação de uma forma mais automatizada, a informação que podes integrar ou não, dependendo da dificuldade, e, aí, vamos poupar e tornar o report da organização mais eficiente. No entanto, uma coisa é fazer isto num departamento de Recursos Humanos que tem dois ou três sistemas, ou num departamento de Risco, que tem dois sistemas; outra coisa é fazer isto numa organização que tem 400 empresas, que tem 14 fontes de informação, são campeonatos completamente diferentes. O caminho está a ser feito e já tem resultados muito impactantes, normalmente, para os nossos clientes. No próximo ano, o foco está no controlo do negócio. Quem não conseguir controlar o seu negócio, perceber a quantas anda, perceber quanto é que é o revenue, quanto é que são os custos da minha empresa, esta vai ser a maior dificuldade; atualmente, a gestão não se coaduna com delays de dois meses, três meses nos dados de informação de vendas. Se olharmos para o tecido empresarial português, o mercado empresarial não nasceu no online, não nasceu no real time, que tem a sua velocidade, e isto é um problema mundial, mas que se está a tentar adaptar a esta nova realidade de ter informação e dados para tudo, a tal data tsunami que hoje em dia existe e que tem que gerir neste mundo caótico de informação, quais são os indicadores mais relevantes para tomar a decisão, e indicadores de mercado para que possa tomar a decisão e ter a atitude certa, a estratégia certa, em termos de vendas, custos, lançar novos produtos, ter mais eficiência. Isto só se consegue com dados. Atualmente, há empresas a procurarem implementar soluções preditivas baseadas em machine learning em Portugal? Fizemos vários projetos em análise preditiva com várias empresas nacionais. Aquilo que é análise preditiva, a utilização de deep learning e de machine learning, é mais um método para lá chegar. No mercado português, começa a haver experimentação, só que ainda não há confiança suficiente; não acho que tenha a ver com os modelos, acho que tem a ver com os dados. Se as empresas fizerem análise preditiva com base em dados que estão errados, vai dar asneira. Se fizerem análise preditiva em dados corretos, com qualidade, assim sim, estão a fazer análise de previsões com dados corretos. O grande problema tem a ver com a confiança nos dados. Quando se começa a entrar em detalhe na informação, nos dados, na qualidade que têm, o tal data lineage, fazemos um processo como se fosse a árvore genealógica dos dados, onde é que nasce e até onde é que chega, assim como é que a recolha é feita, de onde é que vem, qual é o intervalo de confiança. É preciso ter isto para ter uma análise preditiva com impacto, com qualidade, com o mínimo de erro. É preciso ter dados com qualidade, e grande parte das empresas não tem. Isso é uma preocupação. Acho que há uma primeira fase de garantir que existe qualidade na informação, garantir que os processos estão implementados, pegar nessa informação e garantir que está a tempo e horas para a tomada de decisão e que é fácil de interpretar, daí entrar na visualização desta informação. Depois, quando se tiver a certeza de que esta informação tem qualidade e que é de facto verdadeira, vale a pena, em alguns use cases, trabalhar depois a análise preditiva. Mas vamos ser claros: nem todas as indústrias, nem todos os negócios necessitam de análise preditiva, por enquanto. Mas a análise preditiva é uma ajuda para os negócios? É mais uma componente no processo de decisão? Acho que para risco, seguradoras, onde há use cases já aprovados, a funcionar, acho que aí sim, scoring de créditos, análise de créditos, entre outros, está provado que têm um impacto e grande parte dos modelos já funcionam, e vemos isto em algumas seguradoras a acontecer. Nas empresas ditas mais de utilities, mais de parte de vendas, não tanto. Ainda não assistimos em Portugal aquilo que está a acontecer lá fora, as empresas a trabalhar análise preditiva com impacto para o negócio, tomar decisões com base nessa informação. Atualmente, em Portugal, a nossa experiência é que há pequenas experiências de utilização de modelos de análise preditiva, deep learning e machine learning para perceber se é um caminho ou não, mas de facto não há uma aposta concreta em usar isto como área. O ano está a acabar e os gestores tentam prever o que será o próximo ano. Na sua visão, no que é que as empresas devem de facto investir dentro desta área? O controlo do negócio é fundamental. Quem não controlar o negócio em tempos de crise, corre um risco enorme de não sobreviver. Depois, investir é revenue. Isto é, há uma área de investimento, cria-se investimento, ou tenho impacto nas vendas, ou na diminuição dos custos. E a terceira coisa, investir em dados de qualidade. Sem dados não se conseguem tomar decisões, não se consegue gerir uma empresa, sem dados corretos. Quem não investir em projetos de análise de informação, de tomada de decisão, e ajudar a tomar a decisão rápida, e agir rapidamente, vai ter dificuldades em sobreviver. O que é que um gestor pode fazer para se assegurar que as decisões estão a ser tomadas sobre dados corretos? Aquilo que normalmente temos como preocupação é 80-20. Olhar para os 20% dos indicadores, e ter 80% de impacto no negócio, ou na tomada de decisão que ele tem. E isso, olhar para esses tais 80%, não precisa de ter os dados todos com qualidade; precisa de ter aqueles dados com que ele toma a decisão com data trust, com informação fidedigna. E depois, ir para trás, perceber de onde é que vêm esses dados, com qualidade, onde é que eles estão e não estão, se estão certos ou errados, e depois há a forma de tentar expurgar a informação que está errada dessa correta. Para quê? Para que ele tenha a informação correta para tomar a decisão. Se tiver uma ferramenta, uma solução, que me dê a possibilidade de tomar uma decisão rápida com dados que sejam updated o mais rapidamente possível, e que esses dados são os dados mais corretos que tenho dentro da organização, são essas três prioridades que tem que ter. Caso contrário, aquilo que existe hoje é informação que pertence ao passado, informação que no mínimo tem um mês, que não sei, de facto, se tem qualidade ou não para tomar decisões, e que normalmente gasto imenso tempo, muitas horas, a alguém preparar-me esta informação, ou então a discutir porque é que este dado, este indicador, é diferente de mim, do meu colega do board, e do outro a seguir. A realidade em grande parte das organizações é que as pessoas não têm informação com qualidade, com rapidez o suficiente para ajudar na tomada de decisão de forma para reagir ao mercado e antecipar e tentar garantir o controlo do seu negócio. |