Desde o final de 2016 que Paula Panarra lidera a Microsoft Portugal. A IT Insight conversou com a diretora-geral sobre a estratégia e a visão da tecnológica para a transformação digital das organizações nacionais. Cloud, mobilidade, liderança e inovação ditam o tom
IT Insight - Como encara este novo desafio, de liderar a Microsoft Portugal? Paula Panarra - Com entusiasmo e enorme responsabilidade. Responsabilidade porque a Microsoft é uma casa com muitos talentos, que interage com um ecossistema de parceiros e de clientes muito grande e que tem um impacto elevado no desenvolvimento do país. Entusiasmo porque estamos a viver um momento único na história da tecnologia e esta nova era digital vem trazer inúmeras oportunidades para o país. É provavelmente a única revolução industrial em que a dimensão do país é irrelevante e na verdade pode lançar-se um negócio para o mundo a partir de Portugal. Temos aquilo que é necessário: o talento e a qualidade das pessoas. Cabe-nos tirar partido dessa oportunidade. É com muito entusiasmo que encaro o papel que a Microsoft pode ter no desenvolvimento e na transformação digital das organizações, da administração pública, das escolas e das comunidades nos próximos anos, em Portugal. Quais as apostas da Microsoft em 2017? Em tecnologias cloud e, portanto, em plataformas de produtividade, de analítica e de Azure enquanto a cloud que permite correr todas as aplicações. A cloud é o enabler da transformação digital que empresas e administração pública podem fazer nos próximos anos. Permite, primeiro, que empresas muito pequenas acedam a tecnologia em modelos de software-as-a-service. É também um enabler de escala, que permite testar e reajustar muito rapidamente, aportando a agilidade de que os negócios precisam para serem competitivos, sejam negócios já existentes e em transformação ou que estejam a surgir. Temos visto inúmeras startups a surgir, algumas com uma dimensão global muito relevante, graças à cloud. A aposta é sustentar a estratégia de plataforma cloud da Microsoft. Vemos a transformação digital assente em quatro pilares. Por um lado, a relação com o cliente, desde o omnicanal à presença na web e ao e-commerce, passando pelo CRM – ou seja, o modo como o digital pode tornar mais eficiente a relação com o cliente. O segundo pilar é a modernização do posto de trabalho, tendo em conta o que a cloud possibilita: produtividade em mobilidade, colaboração em tempo real e em qualquer lugar, videoconferência a um preço muito acessível e até a possibilidade de levar o self-service analytics para o posto de trabalho, para uma tomada de decisão mais informada. O terceiro pilar é a otimização das operações, através da desmaterialização de processos, da otimização da linha de produção, da manutenção preditiva com IoT, da robotização de alguns processos. O último pilar é a criação de novos serviços e negócios. Fala-se muito das nativas digitais, mas há um trabalho a desenvolver nos negócios estabelecidos e na criação de novos serviços, no modo como as empresas se transformam através da personalização dos serviços que prestam, por exemplo. Há um sem número de possibilidades. Começam a existir projetos na administração pública em cloud? O que está a ser feito? Tem sido um caminho que temos ajudado a fazer. A realidade é que a maioria da informação é pública e portanto não há questões de regulação ou soberania que limitem a utilização de cloud. Temos vários clientes na administração pública a adotar, por exemplo, Office 365, que lhes permite ter uma única plataforma de comunicação e colaboração. O nosso caso mais emblemático é o Serviço Nacional de Saúde (SNS), que neste momento está numa plataforma de Exchange Online. Outra área de cloud a ser muito adotada diz respeito aos websites públicos. No website do SNS, por exemplo, há inúmeros dashboards que disponibilizam informação sobre a saúde em Portugal, em tempo real, e que estão assentes numa plataforma de Power BI que corre na cloud. Cada vez mais todas as instituições, incluindo a administração pública, veem na cloud uma vantagem de escala, de rapidez e em muitos casos de eficiência e redução de custos, salvaguardando toda as questões de privacidade e segurança que qualquer instituição deve ter em conta. Nas empresas que não são nativas digitais, sobretudo as de menor dimensão, como sente a Microsoft a adoção da cloud? Talvez o primeiro passo esteja a ser a modernização do posto de trabalho, com a adoção de normas de trabalho mais em mobilidade. Tudo o que é a adoção de Office 365 está a acontecer a um ritmo acelerado em empresas de qualquer dimensão. Vemos também projetos de e-commerce a tornarem-se cada vez mais relevantes, porque a presença na web, per si, já não é suficiente. No entanto, a sua evolução para um canal de negócio começa a tornar-se relevante. A analítica é outro tema cada vez mais presente. O utilizador final tem hoje acesso a informação relevante para a gestão do negócio de uma forma mais friendly. Mesmo nas empresas pequenas estamos a assistir a uma adoção cada vez maior dessas tecnologias de dashboards e de analítica. As empresas começam a passar aplicações line of business para cloud? Estamos, em conjunto, com a Primavera, a dinamizar essa transformação. Neste momento a Primavera tem as suas soluções tradicionais também disponíveis na cloud, com todas as vantagens de ser uma subscrição e de funcionar como um serviço. No fundo traz um modelo de IT moderno para PMEs. Estamos, sim, a assistir a uma migração de aplicações line of business para cloud. Isso é válido nas PME e igualmente nas grandes empresas. De cada vez que se reavaliam os investimentos em data center reequaciona- se até que ponto faz sentido um novo investimento de CAPEX ou na cloud. A maioria dos clientes optam por infraestruturas híbridas. Muitas vezes inicia-se por um processo de lift and shift, ou seja, migrar uma dada aplicação. Mas todas as empresas estão a perceber que a agilidade de desenvolvimento e de construção de novas aplicações na cloud é completamente diferente da que tínhamos no modelo tradicional. O go to market atual e a competitividade do mercado solicitam uma agilidade na resposta do IT. Quem está a liderar os processos de transformação digital nas empresas? Acreditamos que uma transformação digital de fundo, numa empresa, só acontece se for uma decisão da liderança. Associada a essa transformação vem uma transformação grande dos processos, muitas vezes até da organização, da forma de trabalhar e de operar. Ou é uma decisão estratégica, e tida em conta pelo CEO, que depois permeia a organização, ou pode acontecer como projetos ad hoc e não como um caminho de transformação que a empresa terá de percorrer. Hoje o negócio gasta quase tanto em tecnologia como o IT, porque a maioria dos processos de decisão estão assentes em tecnologia. Se uma empresa quer uma abordagem estratégica à transformação digital, a decisão tem de vir da liderança de topo. "Se uma empresa quer uma abordagem estratégica à transformação digital, a decisão tem de vir da liderança de topo"
Temos feito um grande trabalho com o objetivo de sensibilizar para o facto da transformação digital ser um caminho de fundo, e não um projeto, que requer liderança e projetos de change management associados. Alguns dos eventos que temos já organizado dirigem-se a CEOs ou CXOs das empresas. Um CFO da era digital é diferente do da era tradicional. Temos tentado chegar a todas as áreas e não apenas ao IT, com quem fazemos sempre um trabalho de fundo, do ponto de vista da evangelização dos nossos roadmaps e do modo como vemos o futuro da tecnologia. Nos dois últimos anos verificou-se uma alteração relativamente ao sentido de urgência, que é hoje muito maior. Adquirir soluções tecnológicas de nada serve se as organizações não estiverem capacitadas para as utilizar. Há uma mudança de mentalidade em Portugal, para gerir o negócio de uma forma data-driven? As novas gerações já são muito mais data-driven. Muitas vezes são as próprias startups que trazem as inovações para dentro das empresas, ao invés de terem de ser as empresas a criar de raiz novas soluções para esta era. Todas as ferramentas de analítica que surgiram nos últimos anos tornam o acesso e a leitura da informação mais céleres. Trouxeram também uma democratização dos dados e da sua utilização no dia-a-dia. Os processos morosos para os quais era necessário a intervenção do IT, que levavam várias semanas, atualmente são já muito rápidos, pelo recurso a estas ferramentas, que analisam a informação estruturada e não estruturada, oferecendo os insights mais importantes para a tomada de decisão. Existe cada vez mais vontade, por parte das empresas, em ter acesso a este tipo de informação. Qual a atual estratégia de mobilidade da Microsoft? Um dos principais pilares foi a aposta em assegurar que todas as nossas aplicações podem ser acedidas e utilizadas em qualquer sistema operativo e dispositivo. É aí que reside o segredo da nossa nova estratégia, que é válida não apenas nas ferramentas de produtividade, mas também na plataforma Azure, que permite correr SAP, Oracle e Open Source, do mesmo modo que é possível aceder a todas as aplicações de produtividade num dispositivo Android, iOS, ou Windows Phone. A Microsoft fez ainda uma grande aposta no Surface, ao verificar que existia espaço para um dois-em-um. Esta aposta foi muito bem-sucedida em Portugal. Que recomendações daria a quem está a iniciar uma estratégia de transformação digital? É necessária uma abordagem estratégica e integrada, e não apenas um projeto ad hoc. Deve ser uma estratégia consistente, por exemplo a três anos, com um caminho é marcado por vários projetos. Por outro lado é importante não ter medo de arriscar. É também fundamental ter a noção de que a folha de Excel não dará sempre a resposta sobre o retorno do investimento, visto que muitas vezes está a testar-se aquilo que ainda não foi lançado no mercado. É importante perceber a importância de testar, mesmo falhando, de modo a sermos capazes de reinventar o futuro. Por fim, é necessário assegurar que as equipas que trabalham nesses projetos têm as condições necessárias para serem ágeis e rapidamente poderem colocar esta inovação ao serviço dos clientes. Também é importante considerar as startups, e algumas software houses, que já têm soluções customizadas e que dão resposta aos problemas das empresas. Pesquisar no mercado todas as soluções já disponíveis também é importante, uma vez que é mais fácil incorporar uma solução já desenvolvida e testá-la, do que construir tudo de raiz. Existem soluções muito boas a serem desenvolvidas, para os processos mais básicos, como asset management, document management e para processos mais inovadores, como soluções de IoT ou de reconhecimento facial. Uma das nossas apostas tem sido colocar estas startups e empresas em contacto com os nossos clientes, para que estes possam rapidamente incorporar a inovação sem terem de percorrer todo o caminho de desenvolvimento internamente. |